Tese da Letras investiga poética do suicídio
Ana Cecília Carvalho analisa papel da literatura na trajetória da escritora americana Sylvia Plath Priscila Cirino
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screver é uma forma de pensar, de raciocinar. Essa seria a função da escrita, na medida em que permite ao escritor dizer para si mesmo que não é preciso se matar todos os dias, visto que é possível se matar a qualquer dia”. A partir dessa afirmação da escritora Marguerite Duras, a professora do departamento de Psicologia da Fafich Ana Cecília Carvalho, também escritora e psicanalista, concluiu que existe algo no trabalho do escritor que o põe diante de uma escolha terrível: escrever ou morrer. Seguindo essa linha, Ana Cecília desenvolveu sua tese de doutorado sobre a escritora americana Sylvia Plath, que se suicidou em 1963, aos 30 anos. Plath não foi a única. Ao longo do século 20, outras escritoras, como a americana Virginia Woolf, a portuguesa Florbela Espanca e a brasileira Ana Cristina Cesar, se mataram. “Não podemos dizer, porém, que há semelhanças em sua escrita apenas porque tiveram o mesmo fim”, ressalta a pesquisadora, para quem não há como traçar um perfil de autora suicida, pois cada uma viveu em contextos históricos, sociais, culturais e pessoais muito distintos. Ao buscar uma interlocução entre a psicanálise e a literatura, a professora tentou desvendar a finalidade da escrita na vida da autora americana que se matou no auge da carreira literária. “Eu me questionava se haveria um ponto em que a escrita perde sua função e, se ele existe, o que aconteceria a partir dali”, diz Ana Cecília. Com base nesse questionamento, a professora procurou analisar poemas, contos, cartas, diários e um romance, Redoma de vidro, deixados pela autora. Ela pretendia rastrear elementos que testemunhassem marcas de forças destrutivas que, acreditava, estariam presentes na produção da escritora. Nessa etapa, Ana Cecília traduziu 83 poemas e trechos de cartas e diários da autora, anexados à tese. Analisando a obra de Plath, a professora percebeu que havia referências à função “terapêutica” da escrita. “Ela deixou registrada, por exemplo, a convicção de que o ofício de escrever era um recurso para reordenação de seu mundo interior”, observa. Reinvenção Outra característica marcante da personalidade da autora era a reinvenção de suas experiências. Ela escrevia sobre o mesmo fato de formas muito distintas. “Há um episódio em que Plath se vê às voltas com um cisco no olho e registra isso no diário, numa carta para a mãe e num poema. As diferenças são tão nítidas que nem parece o mesmo fato”, exemplifica a psicanalista. Tese: Escrita com fim, escrita sem fim: a poética do suicídio em Sylvia Plath |